Incerteza sobre impostos cripto deixa operadores de iGaming nos EUA em situação indefinida

David Gravel
Escrito por David Gravel
Traduzido por Thawanny de Carvalho Rodrigues

Na 1ª parte de nossa série exclusiva em três partes, exploramos o intricado labirinto de leis tributárias do iGaming nos diversos estados dos EUA e as crescentes pressões regulatórias que os operadores enfrentam. Agora, na 2ª parte, o foco se volta para as criptomoedas, um campo em que a inovação avança a passos largos, enquanto a regulamentação e a orientação fiscal ainda tentam acompanhar esse ritmo. Com a contribuição especializada de Robert Stoddard, Sócio Líder de Tributação da KPMG para a indústria de jogos nos EUA, analisamos como a ascensão dos ativos digitais está transformando os riscos, as regulações e as obrigações de reporte para os operadores de iGaming nos EUA, muito antes de as regras estarem devidamente estabelecidas.

Embora as criptomoedas ofereçam um enorme potencial de inovação para o setor de iGaming, o cenário tributário que as envolve ainda é nebuloso. O crescimento desse tipo de ativo é acelerado, mas as estruturas regulatórias e as legislações fiscais frequentemente ficam para trás. Os operadores ainda aguardam orientações oficiais dos reguladores norte-americanos sobre a aceitação de depósitos em criptomoedas. Além disso, a integração das criptomoedas nas operações de iGaming e apostas esportivas pode gerar uma série de complexidades, como dificuldades no rastreamento de depósitos, conversões, ganhos ou perdas, além da necessidade de cumprir com os requisitos de reporte das informações dos jogadores — exigências que tendem a se tornar ainda mais complexas à medida que o uso de criptoativos se expande.

À medida que as criptomoedas ganham espaço no iGaming, surgem diversas questões: os reguladores dos EUA permitirão seu uso? Como as normas sobre custódia de ativos impactarão os operadores que aceitarem depósitos em cripto? Quem será responsável pelo reporte dessas transações? Os operadores também podem enfrentar desafios para garantir conformidade, especialmente considerando a possibilidade de diferentes regras tributárias estaduais sobre transações com criptoativos no contexto dos jogos. Além disso, aceitar ativos digitais pode introduzir novos riscos operacionais que precisarão ser cuidadosamente gerenciados.

De certa forma, a cripto já chegou ao setor

Um recente anúncio de um operador de cassino tribal físico nos EUA marcou a primeira vez que clientes puderam usar ativos digitais diretamente para financiar transações de jogo dentro de um cassino. A colaboração utiliza uma plataforma de pagamento regulamentada, amplamente empregada na indústria, e o único provedor que permite o acesso a fichas de cassino via criptomoeda. Assim, os clientes podem converter determinados criptoativos em fichas, eliminando um dos principais pontos de atrito bancário. Operadores de iGaming e apostas esportivas nos EUA acompanham atentamente esse movimento e avaliam o que ele pode significar para os próximos passos do setor. Como destacado recentemente pela SiGMA News, operadores tribais estão testando ativamente os limites da inovação digital — e as criptomoedas fazem parte dessa jornada.

A visão do IRS sobre criptomoedas

O Internal Revenue Service (IRS), a Receita Federal dos EUA, atualmente classifica a criptomoeda como propriedade, e não como moeda. Isso significa que cada transação envolvendo cripto pode, potencialmente, gerar um evento tributável. Diferentemente das apostas com dinheiro tradicional, que tributam apenas os ganhos líquidos, o uso de cripto no jogo adiciona camadas extras de complexidade na caracterização e reporte das transações.

  • Imposto sobre Ganhos de Capital: De acordo com as orientações atuais, utilizar criptomoeda para fazer uma compra, realizar uma aposta, resgatar ganhos, sacar ou converter cripto para moeda fiduciária dentro de uma conta de jogador pode ser considerado uma venda ou troca tributável. Como os valores dos ativos digitais flutuam com frequência, os jogadores podem gerar renda tributável ou prejuízos várias vezes ao longo do ciclo típico de uma transação de jogo, dependendo das variações de valor e do tempo decorrido.
  • Retenção de Impostos: Os operadores precisarão reter os impostos exigidos sobre os pagamentos feitos em cripto, da mesma forma que fazem com ganhos em dinheiro. A tênue linha entre o uso de cripto e a renda proveniente de jogos, somada às orientações pouco claras do IRS, transforma o reporte básico em uma verdadeira zona de risco. Mesmo com a recente revogação das regulamentações de ativos digitais aplicáveis a plataformas DeFi nos EUA, os operadores de iGaming e apostas esportivas devem acompanhar atentamente os desdobramentos futuros e avaliar se podem ser considerados corretores custodiantes de ativos digitais.
  • Impacto da Volatilidade: A natureza volátil das criptomoedas significa que os ganhos podem ser tributados a diferentes taxas, dependendo do momento em que são realizados.

Diferenças entre estados: mais um complicador

Cada estado pode tratar as transações com criptomoedas de maneira distinta. Se, ou quando, o uso de cripto for autorizado como fonte de fundos para jogadores de iGaming e apostas esportivas nos EUA, os operadores enfrentarão ainda mais incertezas regulatórias. O panorama tributário norte-americano, fragmentado estado por estado, já é um quebra-cabeça; e a cripto pode adicionar novas peças, inclusive em estados que, à primeira vista, parecem mais receptivos ao uso generalizado de ativos digitais. Sem uma abordagem uniforme, os operadores que atuam em múltiplos estados provavelmente terão que lidar com diferentes obrigações de conformidade, complicando ainda mais o reporte tributário.

KYC, AML e reporte fiscal: o setor está preparado?

As exigências de verificação de identidade (KYC) e Prevenção à Lavagem de Dinheiro (AML) já são rigorosas para transações tradicionais de iGaming e apostas esportivas, mas a adoção futura de criptomoedas tende a tornar esses processos ainda mais desafiadores.

  • Verificação da Identidade do Jogador: Ao contrário das transações com moeda fiduciária, os pagamentos em cripto podem ser pseudônimos, dificultando o rastreamento das apostas e ganhos dos jogadores, o que torna a correta declaração fiscal ainda mais crucial.
  • Riscos de Conformidade com AML: Não é surpresa que os reguladores estejam cada vez mais atentos às criptomoedas em geral. Operadores que não mantiverem controles robustos sobre o rastreamento de transações podem estar correndo sérios riscos.
  • Obrigações de Reporte Fiscal: Alguns estados podem exigir que os operadores reportem transações com cripto da mesma forma que relatam ganhos tradicionais de jogo. Contudo, a possível separação entre uma transação de jogo e o reconhecimento de ganhos ou perdas relacionados às flutuações no valor dos ativos digitais dentro de uma cadeia transacional conectada pode tornar futuras obrigações de reporte ainda mais complexas.

Assim, os operadores devem garantir que seus métodos de reporte fiscal estejam alinhados com as regulamentações em evolução, evitando, assim, penalidades por descumprimento.

E o que vem pela frente para a tributação de criptomoedas no iGaming?

Atualmente, há mais oportunidades e foco em criptomoedas no setor de apostas online — e o movimento vem de cima. São estas as mudanças que merecem atenção caso, ou quando, os operadores norte-americanos forem autorizados a aceitar depósitos em cripto:

  • Possíveis Orientações do IRS: Como será a futura orientação da Receita, e ela trará clareza suficiente sobre a tributação de ganhos em cripto e outras transações?
  • Legislação Específica por Estado: Alguns estados já consideram regulamentar as apostas com criptomoedas, mas há divergências significativas sobre como essa regulamentação deve funcionar.
  • Medidas de Fiscalização Mais Rigorosas: Os reguladores estão reprimindo cassinos não licenciados que operam com cripto, o que pode levar a requisitos de conformidade ainda mais estritos para operadores regulamentados.
  • Considerações Transfronteiriças: Tratados fiscais e conflitos de jurisdição podem complicar os esforços de conformidade à medida que operadores internacionais entram no mercado norte-americano.

As leis tributárias relacionadas a cripto continuam sendo um alvo móvel. Os operadores precisam de planos tributários flexíveis que consigam se adaptar às regulamentações futuras, pois aguardar um quadro claro e consistente em todo o país pode fazer com que alguns fiquem para trás.

Uma dor de cabeça tributária que não vai desaparecer

O setor de iGaming com cripto continua evoluindo, mas as leis tributárias ainda não acompanharam essa transformação. Contar com a esperança de que a situação será esclarecida não é uma estratégia. A mensagem é clara: resolva a questão agora ou prepare-se para que outro defina os rumos.

A falta de regras fiscais claras deixa a indústria no escuro — um cenário nada ideal. Os operadores fariam bem em concentrar-se nas oportunidades de mercado, identificar abordagens concretas para integrar a cripto aos seus planos operacionais, estabelecer processos para se adaptar às mudanças nas leis e regulações tributárias e definir suas estratégias com antecedência.

Na Parte 3, vamos expandir o foco e analisar como operadores do Reino Unido podem entrar no mercado dos EUA sem cair nas armadilhas fiscais transfronteiriças mais comuns.

Robert B. Stoddard
Partner, Tax | U.S. iGaming Tax Lead

*Robert é sócio da área de Serviços de Tributação Empresarial da KPMG em Stamford, com 23 anos de experiência em planejamento fiscal, conformidade e provisões de imposto de renda. Atende clientes nacionais e multinacionais em diversos setores e atualmente lidera a prática de Tributação para Jogos da KPMG nos EUA.

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