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À medida que a Finlândia se aproxima de desmantelar seu monopólio sobre os jogos de aposta e introduzir um regime competitivo de licenciamento até 2027, os legisladores buscam equilibrar a liberalização do mercado com medidas de proteção à saúde pública.
De acordo com a proposta de Lei dos Jogos do governo, o monopólio digital atualmente detido pela estatal Veikkaus será encerrado, permitindo que operadores privados ingressem no mercado mediante sistema de licenças. Também será criada uma nova autoridade reguladora responsável por supervisionar o cumprimento das normas, com a introdução de verificações obrigatórias de identidade, ferramentas de autoexclusão e regras mais rígidas para publicidade, como parte de um pacote mais amplo de reformas.
Na semana passada, o Comitê Parlamentar Finlandês de Assuntos Sociais e Saúde (CSAH) emitiu parecer sobre o projeto de lei, expressando preocupação de que, da forma como está, a proposta pode aumentar os danos relacionados ao jogo e seus custos sociais associados. O comitê sugeriu que a idade mínima para participação em jogos de aposta seja elevada para 20 anos e recomendou a proibição de publicidade em espaços públicos, além da adoção de restrições mais severas ao marketing, afirmando que jovens adultos (entre 18 e 24 anos) devem receber “proteção especial”.
O CSAH destacou que o jogo não deve ser encarado como um bem de consumo comum, dada sua natureza potencialmente viciante e os prejuízos sociais mais amplos que pode causar. Embora o parecer não proponha alterações diretas ao texto, orienta os legisladores a priorizar a prevenção de danos em detrimento de interesses comerciais.
Agora, cabe ao Comitê Administrativo do Parlamento consolidar os pareceres de diversos subcomitês antes do debate final e da votação sobre a proposta.Para entender melhor os desafios legais e as implicações mais amplas da reforma proposta, a SiGMA World conversou com exclusividade com Antti Koivula, assessor jurídico da Legal Gaming Attorneys at Law.
SiGMA World: Quais desafios você prevê na implementação do novo sistema de licenciamento, previsto para 2026-2027?
Antti Koivula, Assessor Jurídico da Legal Gaming Attorneys at Law: A criação de uma nova autoridade de licenciamento e supervisão, do zero, representa um enorme desafio burocrático. Será necessário identificar as melhores práticas, contratar profissionais qualificados e colocar toda a infraestrutura e processos operacionais em funcionamento — e isso vai demandar tempo. Prevejo uma série de desafios práticos, especialmente nos estágios iniciais da implementação.
Além disso, diversos conceitos fundamentais, regras e disposições no atual arcabouço proposto ainda estão mal definidos. Sem uma orientação clara e oportuna por parte das autoridades, há um risco considerável de insegurança regulatória. Essa falta de clareza pode levar a interpretações inconsistentes, ações de fiscalização desnecessárias contra operadores licenciados e um aumento generalizado da insatisfação com o sistema.
Um ponto particularmente preocupante é o tratamento tributário dos jogadores.
Ganhos obtidos com operadores não licenciados serão tributáveis — como devem ser —, mas a impossibilidade de deduzir perdas cria um resultado desproporcional e injusto. Cada rodada de jogo será tratada como um evento tributável separado, o que significa que o resultado final de uma sessão de jogo — ou mesmo prejuízos acumulados no longo prazo — será irrelevante para as autoridades fiscais.
Um jogador, por exemplo, pode acumular centenas de milhares de euros em “renda tributável”, mesmo encerrando a atividade com prejuízo de milhares de euros. Pior ainda, não declarar essa chamada renda pode ser considerado fraude fiscal agravada, com pena de até quatro anos de prisão. A aplicação rigorosa desse regime tributário a partir do início de 2027 causaria um caos: dezenas de milhares de jogadores — muitos deles já lidando com problemas de vício — poderiam enfrentar responsabilidade criminal. O sistema judiciário finlandês simplesmente não conseguiria lidar com esse volume de processos.
Outro desafio significativo será a fiscalização contra o mercado ilegal. Sem mecanismos robustos e eficazes, é provável que operadores não autorizados continuem prosperando. Embora o regulador atual — o Conselho Nacional de Polícia — tenha demonstrado confiança na adequação das ferramentas de fiscalização propostas, sou bem mais cético, principalmente quanto à sua eficácia para conter atividades ilegais, além da mera supervisão de operadores licenciados. Essa distinção é crucial: sem uma estratégia direcionada para combater as ofertas não autorizadas, o mercado ilegal continuará sendo uma ameaça séria aos objetivos do novo sistema.
Além disso, a proposta de proibição de marketing por afiliados, as severas limitações a bônus e uma postura extremamente restritiva em relação à publicidade online provavelmente reduzirão a taxa de canalização — ou seja, a migração de jogadores para o mercado regulado. Isso pode resultar em um aumento da publicidade em canais tradicionais, onde as regras são comparativamente mais brandas, o que, por sua vez, pode gerar uma reação negativa da opinião pública. Esse cenário pode levar a respostas regulatórias adicionais, como novas restrições à publicidade, que acabariam favorecendo o mercado ilegal, em detrimento do ecossistema licenciado.
SiGMA World: FDo ponto de vista jurídico, quais são os principais desafios para equilibrar o controle regulatório com a liberalização do mercado na nova Lei dos Jogos?
Antti: O desafio mais urgente, do ponto de vista regulatório, é garantir uma fiscalização eficaz contra operações ilegais transfronteiriças. Sem mecanismos de aplicação realmente críveis, há pouco incentivo para que os operadores ingressem no sistema de licenças e cumpram com as obrigações e restrições associadas. Isso mina o objetivo central da reforma: aumentar a canalização.
Encontrar o equilíbrio ideal entre medidas de jogo responsável, limitações ao marketing e a atratividade do mercado regulado é, por natureza, uma tarefa difícil. Embora a nova Lei Finlandesa de Jogos seja um avanço, preocupa-me especialmente que os formuladores de políticas estejam subestimando o impacto das severas restrições ao marketing online.
Essas medidas podem acabar marginalizando pequenos e médios operadores, enfraquecendo ainda mais a taxa de canalização e, inadvertidamente, fortalecendo o mercado ilegal.
SiGMA World: Na sua opinião, quais são os próximos passos após o Comitê Administrativo do Parlamento preparar seu relatório sobre a proposta do governo?
Antti: O Comitê Administrativo continuará o processo analisando as declarações enviadas por outros comitês parlamentares e conduzindo audiências com especialistas, que começaram na semana passada. Até o momento, cinco dos seis comitês relevantes já apresentaram suas declarações; apenas a manifestação do Comitê de Direito Constitucional ainda está pendente.
Assim que o Comitê Administrativo concluir suas deliberações, poderá propor emendas ao projeto. Em seguida, o texto será encaminhado para uma sessão plenária do Parlamento, onde será debatido e, finalmente, votado.