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O Kansas acendeu o pavio do seu próprio mercado de apostas esportivas. Uma cláusula de última hora incluída no orçamento estadual proibiu a renovação ou renegociação de contratos com casas de apostas até junho de 2026, criando um cenário de incerteza para o futuro das seis operadoras atualmente licenciadas no Estado do Girassol.
A nova lei foi aprovada no último dia da sessão legislativa do Kansas. Ela anulou o veto da governadora Laura Kelly e impede a Loteria do Kansas de usar recursos públicos para prorrogar contratos com operadores de apostas esportivas. Com isso, o mercado foi lançado em um limbo jurídico. A atividade continua legalizada, mas todos os contratos vigentes têm data marcada para expirar em 2027. O tempo avança silenciosamente no Kansas, onde os contratos dormem com um olho aberto e o futuro pisca como uma lâmpada prestes a queimar.
Atualmente, FanDuel, DraftKings, BetMGM, Caesars, ESPN Bet e Fanatics operam por meio de acordos com quatro cassinos físicos. Esses contratos têm validade até agosto de 2027. A menos que os legisladores mudem de ideia, cada uma dessas operadoras será forçada a encerrar suas atividades quando os acordos expirarem.
O estado legalizou as apostas esportivas em 2022, com a aprovação do Projeto de Lei do Senado 84, apresentando uma das menores alíquotas de imposto do país. O Kansas tributa as operadoras em apenas 10%, e ainda permite que abatam integralmente os créditos promocionais. Como resultado, o estado arrecadou apenas 3,9% da receita bruta no primeiro ano de operação.
Isso gerou desconforto entre os parlamentares. A deputada estadual Barb Wasinger, que liderou o movimento pela inserção da cláusula no orçamento, argumentou que as prorrogações contratuais estavam sendo encaminhadas sem que o modelo de arrecadação fosse reavaliado.
“Somos um dos estados que menos arrecadam com as apostas esportivas”, afirmou Wasinger a uma comissão da Câmara. “Isso não está beneficiando os cidadãos do Kansas.”
A Loteria do Kansas alertou que esse congelamento pode gerar complicações legais. O diretor de Jogos, Keith Kocher, afirmou que as operadoras estruturaram suas plataformas com base nos termos fiscais vigentes. Alterar essas condições no meio do contrato pode resultar em processos judiciais ou pedidos de compensação.
A emenda aprovada não proíbe as apostas esportivas, mas deixa o mercado vulnerável. Com a concessão de novas licenças congelada, há quem tema que os legisladores estejam preparando o terreno para a adoção de um modelo gerido pelo estado ou com exclusividade para uma única operadora. Experiências semelhantes em Washington, D.C., e Oregon tiveram desempenho abaixo do esperado, com menos opções para os consumidores e queda na arrecadação de impostos.
Brendan Bussmann, sócio da consultoria B Global Advisors, não poupou críticas: “Pelo visto, no conservador Kansas, estão tentando descobrir de novo por que o comunismo não funciona”, ironizou.
Enquanto isso, o estado vizinho, Missouri, se prepara para lançar suas plataformas de apostas móveis. Caso o Kansas tropece em seu modelo, a fuga de apostadores para além das fronteiras será praticamente inevitável.
Entidades do setor, como a Sports Betting Alliance (SBA) e a iDevelopment and Economic Association (iDEA), condenaram a manobra orçamentária adotada no Kansas. A SBA, que representa quatro das seis operadoras do estado, lembrou que os contratos atuais seguem válidos até 2027. Mas a mensagem de fundo foi clara: o Kansas está colocando seu mercado regulado em risco.
“Essa manobra orçamentária é irresponsável e ameaça desestabilizar um mercado de apostas esportivas que vinha funcionando com sucesso e sob regulamentação”, afirmou John Pappas, diretor de advocacy estadual da iDEA.
O receio é que, quando os contratos expirarem, o Kansas se transforme em um deserto digital, empurrando os apostadores para plataformas ilegais no exterior, que não geram receita tributária nem oferecem garantias aos consumidores.
O Kansas não é o único estado a adotar medidas abruptas. Recentemente, o Illinois introduziu uma escala tributária progressiva que pode chegar a 40%. O Ohio dobrou sua alíquota de imposto sobre apostas esportivas para 20% em menos de um ano. Maryland e Massachusetts também estudam aumentos expressivos. Em nível federal, o SAFE Bet Act promete impor novas regras e restrições ao setor.
Some-se a isso a proibição do Wire Act sobre apostas interestaduais, e o resultado é um verdadeiro campo minado para as operadoras, com regras locais inconsistentes, aumento de custos e intervenções políticas. Essa fragmentação dificulta o planejamento de longo prazo e afasta investimentos em novos mercados.
Enquanto alguns estados, como o Mississippi, não conseguem avançar com apostas móveis ou leis contra jogos de prêmios, outros estão travando o próprio sistema. O Kansas é o exemplo mais recente de como a estabilidade regulatória vem sendo trocada pela incerteza, colocando contratos vigentes em pausa, mesmo diante do sucesso do mercado.
A Louisiana, por sua vez, está avançando com uma legislação rigorosa contra cassinos de jogos de prêmios, prevendo inclusive sanções criminais. De congelar mercados legais a criminalizar jogos em áreas cinzentas, os estados estão redesenhando o mapa das apostas com uma velocidade que desafia a capacidade de adaptação das operadoras.
As apostas esportivas nos EUA começaram com entusiasmo e uma proposta de liberdade. Mas os movimentos recentes do Kansas mostram o quão frágil essa trajetória se tornou. O que antes era uma história de sucesso com baixa tributação agora caminha rumo à ruptura, à incerteza e ao excesso regulatório.
O Kansas não deve encerrar as apostas da noite para o dia. No entanto, sua decisão de congelar os contratos envia um recado que ecoa além das suas fronteiras: no sistema fragmentado de apostas dos EUA, nem mesmo a legalidade garante permanência.
O setor pode até estar crescendo, mas sua base está trincando. E, para as operadoras no Kansas, o tempo está correndo.